Eu sou barquinho rasgando
as ondas da maravilha,
homens morenos vogando
o corpo fértil da ilha
Sou uma besta puxando
os dias que o tempo amarra
numa carroça ao comando
da sapiência bizarra
Sou alfarroba varejada,
negro pão da negra fome
Donzela pura, beijada,
laranja doce sem nome
Sou fortaleza cansada
esperando reis que não tornam
Sou natureza indomada
que ouro e prata tanto adornam
Terraço onde o sol dormita
e seca o pouco sustento
Mãos de terra, olhar que grita
a dor que se ouve no vento
Sou rede de caridade
que às águas tanto suplica
Tenho remendos da idade
que nenhum livro me explica
Sou terra moira, romana
de marinheiros, soldados
Tesouro ao sul que emana
seu brilho a todos os lados
Sou casa branca, modesta
que pinta os olhos e a boca
porque é do baile, é da festa
até quando a sorte é pouca.
Paz tem cheiro de alecrim,
Trabalho soa a cigarra,
Mar é o sonho que de mim
se solta, e na areia se agarra,
pra que jamais tenha fim
Olha bem fundo, minh' amada,
nas amêndoas deste olhar.
Verás infância vergada
nesta terra semeada
de impérios mortos pelo mar
Verás que sou dessa raça
Marafada, destemida,
vadia como a luz da tarde.
E vais comprar-me na praça,
colher-me à sombra, devassa,
faminta de Liberdade.
Roberto Leandro
P.S: O Mês da Poesia é um desafio interactivo promovido pelo Opina com o objectivo de dar espaço aos nossos leitores para partilharem os seus escritos poéticos. O Mês da Poesia será realizado regularmente de 2 em 2 meses subordinado a uma temática apresentada durante o mês anterior. O tema do mês de Outubro é: LIBERDADE. Enviem-nos os vossos poemas por mensagem privada na página de Facebook do Opina ou por comentário aqui no blog. No caso de haver uma enxurrada de poemas, faremos uma pré-selecção e os poemas seleccionados serão publicados, como de costume, aos Domingos. Boas leituras!